Mas seu eu tivesse que eleger o melhor deles,
escolheria a palestra do estilista Jum Nakao,
"A Costura do Invisível."
Mais do que um estilista,
Nakao é um artista, um criador.
No início da palestra, com as luzes do auditório
diminuídas e um slide onde estava escrito:
Ele inicia a palestra nos contando,
com sua fala tranquila,
um episódio que transformou a sua vida:
Durante uma viagem há alguns anos atrás,
ele foi convencido a fazer um passeio
de veleiro, ao invés do passeio de lancha,
para o qual já havia comprado o ingresso.
No caminho, enquanto apreciava a paisagem,
passou rapidamente por eles a lancha cheia
de pessoas acenando.
Nesse momento o dono do veleiro observou:
Para as pessoas que estão naquele barco
não há passeio. Há apenas a linha de partida e
a linha de chegada.
A partir daí, Jum nos convida a um mergulho.
Um mergulho que transformaria nossas vidas.
O mergulho na criação, execução e apresentação
do fantástico desfile apresentado por ele
no Sao Paulo Fashion Week de 2004,
conhecido como desfile da coleção de papel.
Este, que foi considerado o melhor desfile do século,
começou com o desejo de Jum de criar
um encantamento que durasse 5 minutos,
o tempo do desfile na passarela.
Ele nos conta sobre as dificuldades em conseguir
papel, patrocínio, enfim, sobre o árduo
caminho que levou 182 dias, mais de 700 horas
de trabalho, inúmeras pessoas das mais diversas
áreas trabalhando em conjunto,
que resultaram em roupas incrivelmente
elaboradas e inspiradas no séc XIX, e
totalmente feitas em papel.
As modelos usaram perucas playmobil,
fazendo uma referência à produção industrial
em contraste com a leveza e originalidade
das roupas de papel, que transmitiam
leveza e inovação.
"E o contraste entre as referências,
a unicidade da indumentária do séc. XIX
e a reprodutibilidade do boneco playmobil,
criaria um instantâneo sem espessura:
passado e futuro juntos, evidenciando a
transitoriedade das estéticas e linguagens
e achatando inteiramente a perspectiva temporal.
Um novo sentido se criava, rompendo
as referências temporais. "
Todo o processo foi cercado de segredo,
ninguém sabia que as roupas seriam de papel,
nem mesmo as modelos, que acreditavam
que as roupas que estavam sendo costuradas
nos seus corpos (pois os modelos não permitiriam
ajustes posteriores), eram apenas a modelagem.
Depois de nos contar esta história,
Jum Nakao nos apresentou o vídeo do desfile,
em que ao final todas as roupas foram rasgadas
(as modelos só souberam que teriam que rasgar
as roupas minutos antes de entrarem na
passarela) e a reação de espanto
e incredulidade tanto das modelos,
quanto das pessoas que
assistiram ao desfile.
Jum Nakao fez do público parte do
processo criativo, pois queria eternizar a reação
do público diante da destruição de todo
o trabalho ali apresentado.
Destruição?
Não para ele, que diz que todo o trabalho
em grupo, o aprendizado, o mergulho
necessário para criar algo realmente inovador,
foi o que ficou e marcou para sempre sua vida.
Jum nos proporcionou uma viagem,
em que pensamos sobre o processo criativo.
Através de imagens e sons,
inquietações próprias dos que trabalham com
criação são trazidas à tona, e
nos conduz ao mergulho para
desvendar o que não se vê sem
o pensamento, e nessas profundezas
nos tornamos parte desta
incrível e emocionante viagem.
E na mesma manhã em que soubemos
da perda de José Saramago,
Jum Nakao nos lembrou o que o
grande escritor não se cansava de declarar:
Que a essência é mais importante que a superfície.
Que o efêmero também pode permanecer.
E assim, a minha vida, e estou certa
que também a de muitas pessoas
que participaram deste mergulho,
mudou para sempre...
Assista o vídeo do desfile aqui.