sexta-feira, 21 de novembro de 2008

A beleza da Feira


Da série eu a-d-o-r-o,
eu a-d-o-r-o passear sem compromisso na feira!
Fico absolutamente fascinada pelo colorido,
pela organização , pela composição cromática,
Foto de Vanessa Soli
e pela mistura de perfumes e sabores das feiras livres!
Se eu fosse uma escritora, descreveria minha experiência em feiras como
Rubem Alves fez, em texto que eu encontrei no Projeto Releituras, e que reproduzo em parte nesta postagem.
Foto de Inpontes
"Um dos meus prazeres é passear pela feira. Vou para comprar. Olhos compradores são olhos caçadores: vão em busca de caça, coisas específicas para o almoço e a janta. Procuram. O que deve ser comprado está na listinha. Olhos caçadores não param sobre o que não está escrito nela.
Mas não vou só para comprar. Alterno o olhar caçador com o olhar vagabundo. O olhar vagabundo não procura nada. Ele vai passeando sobre as coisas. O olhar vagabundo tem prazer nas coisas que não vão ser compradas e não vão ser comidas.

Foto de Alf Ribeiro
O olhar caçador está a serviço da boca. Olham para a boca comer. Mas o olhar vagabundo, é ele que come. A gente fala: comer com os olhos. é verdade. Os olhos vagabundos são aqueles que comem o que vêem. E sentem prazer.
A Adélia diz que Deus a castiga de vez em quando, tirando-lhe a poesia. Ela explica dizendo que fica sem poesia quando seus olhos, olhando para uma pedra, vêem uma pedra.
Na feira é possível ir com olhos poéticos e com olhos não poéticos.
Os olhos não poéticos vêem as coisas que serão comidas. Olham para as cebolas e pensam em molhos. Os olhos poéticos olham para as cebolas e pensam em outras coisas.

Como o caso daquela paciente minha que, numa tarde igual a todas as outras, ao cortar uma cebola viu na cebola cortada coisas que nunca tinha visto. A cebola cortada lhe apareceu, repentinamente, como o vitral redondo de catedral.
Pediu o meu auxílio. Pensou que estava ficando louca. Eu a tranqüilizei dizendo que o que ela pensava ser loucura nada mais era que um surto de poesia.
Para confirmar o meu diagnóstico lembrei-lhe o poema de Pablo Neruda "A Cebola", em que ele fala dela como "rosa d'água com escamas de cristal".
Depois de ler o poema do Neruda uma cebola nunca será a mesma coisa.


Ando assim pela feira poetizando, vendo nas coisas que estão expostas nas bancas realidades assombrosas, incompreensíveis, maravilhosas.


Pessoas há que, para terem experiências místicas, fazem longas peregrinações para lugares onde, segundo relatos de outros, algum anjo ou ser do outro mundo apareceu.
Quando quero ter experiências místicas eu vou à feira.
Cebolas, tomates, pimentões, uvas, caquis e bananas me assombram mais que anjos azuis e espíritos luminosos. Entidades encantadas. Seres de um outro mundo. Interrompem a mesmice do meu cotidiano.Pimentões, brilhantes, lisos, vermelhos, amarelos e verdes.
Ainda hei de decorar uma árvore de Natal com pimentões.

Foto de Babileta
Nabos brancos, redondos, outros obscenamente compridos.
Lembro-me de uma crônica da querida e inspirada Hilda Hilst que escandalizou os delicados: ela ia pela feira poetizando eroticamente sobre nabos e pepinos. Escandalizou porque ela disse o que todo mundo pensa mas não tem coragem de dizer.
Roxas berinjelas, cenouras amarelas, tomates redondos e vermelhos, morangas gomosas, salsinhas repicadas a tesourinha, cebolinhas, canudos ocos, bananas compridas e amarelas, caquis redondos e carnudos (sobre eles o Heládio Brito escreveu um poema tão gostoso quanto eles mesmos), mamões, úteros grávidos por dentro, laranjas alaranjadas (um gomo de laranja é um assombro, o suco guardado em milhares de garrafinhas transparentes), cocos duros e sisudos, pêssegos, perfume de jasmim do imperador, cachos de uvas, delicadas obras de arte, morangos vermelhos, frutinhas que se comem à beira do abismo...

Foto de Inpontes
Foto de Inpontes

Minha caminhada me leva dos vegetais às carnes: lingüiças, costelas defumadas, carne de sol, galinhas, codornizes, bacalhau, peixes de todos os tipos, camarões, lagostas.
Os vegetarianos estremecem. Compreendo, porque na alma eu também sou vegetariano. Fosse eu rei decretaria que no meu reino nenhum bicho seria morto para nosso prazer gastronômico. Mas rei não sou. Os bichos já foram mortos contra a minha vontade. Nada posso fazer para trazê-los de volta à vida. Assim, dou-lhes minha maior prova de amor: transformo-os em deleite culinário para que continuem a viver no meu corpo.
De alguma maneira vivem em mim todas as coisas que comi.
Foto de Felipe Neves

Sobre isso sabia muito bem o genial pintor Giuseppe Arcimboldo (1527-1593), que pintava os rostos das pessoas com os legumes, frutas e animais que se encontram nas bancas da feira. (Dê-se o prazer de ver as telas de Arcimboldo.
Nas livrarias, coleção Taschen, mais ou menos quinze reais).



Vertumnus


Leia o texto de Rubem Alves na íntegra aqui.

Foto de Chico. Ferreira

Foto de Babileta

E boa sexta-feira!

3 comentários:

Luiz Borges disse...

O que mais gostei nessa feira é o fato de não precisar entrar na fila para pesar...

Pianista disse...

É belo passear numa feira tão colorida! Dá vontade de fazer saladas, molhos, saladas de frutas, enfim, comprar uma porção de coisas, levar para casa e enfeitar as fruteiras com tanta cor!E depois consumir tudo, com o maior prazer. Linda esta postagem, Aninha!Beijos de tua fã incondicional.

Fifi Flowers disse...

I adore fresh produce at farmer stands... YUM! Beautiful photos!
ENJOY!
Fifi